A pandemia trouxe o processo de isolamento, as dificuldades, as adaptações profissionais, o medo e a preocupação por nós e por aqueles que amamos, entre tantas outras aflições. Isso desencadeou uma série de mecanismos emocionais e psicológicos que ainda serão sentidos e analisados pelas próximas décadas.
Porém, muitos desses desequilíbrios têm consequências imediatas na saúde e na qualidade de vida. Entre eles o estresse, que, além de afetar os indivíduos emocionalmente, é um entrave no que diz respeito à saúde do corpo.
Maria Julia Coto, nutricionista e consultora em nutrição da Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães & Bolos Industrializados (Abimapi), ressalta que o estresse é considerado uma epidemia, caracterizada, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quando a condição atinge 90% da população mundial.
E o problema de saúde, que era preocupante antes da pandemia do novo coronavírus, tornou-se ainda mais grave ao longo de 2020. Situações tensas, assim como ansiedade e irritação, promovem, no organismo, uma liberação excessiva de cortisol, para diminuir o estresse e restaurar o equilíbrio do corpo. É muito importante, pois aciona os mecanismos de fuga e alerta do organismo, mas, em excesso, pode ser muito prejudicial à saúde.
Conhecido como hormônio do estresse e liberado pela parte superior da glândula suprarrenal, o cortisol faz com que o corpo mobilize as reservas de energia, o que modifica o metabolismo e o fluxo sanguíneo. Dessa forma, além de todos os malefícios que ocasiona ao organismo, o estresse se torna também um inimigo da vida fitness, dificultando o emagrecimento e o ganho de massa magra.
A alta de cortisol retarda o metabolismo, o que favorece o ganho de peso e pode provocar o armazenamento de gordura em áreas de risco, como abdômen e costas, no caso dos homens, e na região dos quadris, nas mulheres, aumentando as chances de doenças como infarto e diabetes. “O desequilíbrio de um sistema do organismo, no caso o endócrino, acaba afetando todos os outros, e podem surgir problemas a curto e longo prazos”, comenta Maria Julia.
Ao mobilizar as reservas de energia, no entanto, o cortisol e a adrenalina, também liberada em momentos de estresse, não se concentram na gordura, mas, sim, na massa muscular. Dessa maneira, ao mesmo tempo em que acumula gordura, o corpo “queima” as reservas de massa muscular.
Além do aspecto hormonal, o estresse interfere na nossa percepção de fome e na vontade de consumir alimentos com pouco valor nutricional. Analisando através da nutrição emocional, Maria Julia ressalta que, entre os tipos de fome que sentimos, existe a fome emocional.
“É quando comemos não porque sentimos a necessidade de nutrir o nosso organismo, mas, sim, pelo conforto que o alimento pode trazer à mente. Normalmente, não é uma refeição nutritiva, mas um chocolate, um doce ou uma fritura. É um mecanismo de fuga do organismo para se acolher” comenta. O consumo de alimentos com baixo valor nutricional também reforça a produção de cortisol, o que reforça o ciclo do estresse e dos malefícios do excesso hormonal.
Fernando Martins Alves, endocrinologista do centro integrado de saúde Tres61, acrescenta que todo o processo causado pelo estresse acaba sendo exacerbado pela ausência de atividade física. “Em virtude do isolamento e do home office, até pequenos exercícios diários, como andar até o local de trabalho ou subir escadas no escritório, deixaram de existir.”
O endocrinologista explica que o aumento no sedentarismo e das dores no corpo, aliado ao estresse, contribuem para desestimular ainda mais a prática de atividade física. Ele ressalta a importância do exercício. “Ao fazer um exercício, o corpo tem aumento de endorfinas e diminuição nos níveis de cortisol e adrenalina. A pessoa se sente melhor logo em seguida e, com a prática, o organismo começa, aos poucos, a voltar ao eixo.”
Esse foi o caso do contador aposentado Evandro Silva Matos, 59 anos. Depois de passar o ano de 2020 todo em casa, respeitando o isolamento e sem praticar nenhuma atividade física, o estresse e o sedentarismo cobraram a conta. “Eu sempre malhei, nunca fui de ficar parado. Mas passei a ter fobia de sair de casa e me sentia tenso o tempo todo. Preocupado com máscara, com álcool em gel e recebendo tantas notícias alarmantes”, conta Evandro.
Acreditando que a falta de atividade faria com que emagrecesse por causa da perda de musculatura, surpreendeu-se quando começou a engordar. Preocupado por não ter tido grandes mudanças na alimentação que justificassem os quilos extras e por ser diabético, fez uma bateria de exames.
Ao pegar os resultados, soube que todas as suas taxas estavam alteradas e que, apesar da necessidade de se manter em isolamento, precisava também cuidar da saúde. Em dezembro do ano passado, começou a se exercitar com acompanhamento personalizado para fugir das aglomerações em academias. “Apesar de não querer engordar, o que me motivou foi a saúde. Estou quase na terceira idade e quero chegar com condicionamento e muita saúde física e mental”, ressalta.
O aposentado afirma que, desde que voltou a se exercitar, tudo melhorou. Menos ansioso e exercitando a paciência, Evandro conta ainda que foge das redes sociais que, para ele, não acrescentam nada de substancial. O tempo livre é dividido entre livros de diversos temas.
Evandro acrescenta a importância do acompanhamento médico, corroborado por Maria Julia e Fernando, que recomendam a busca por profissionais de saúde para cuidar do organismo como um todo, incluindo a saúde mental.
Fonte: Correio Braziliense
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